Eduardo Carvalho

iPad e uma boa pergunta

 Pela Laura -- que deve ter fotografado da revista --, sempre.

João Moreira Salles sobre ciência e humanidades

O discurso do João Moreira Salles para a Academia Brasileira de Ciências -- proferido no 1º Simpósio Academia-Empresa, em março, e publicado pela Folha agora, dia 6 de junho -- é precioso em muitos sentidos. Seu elogio à ciência -- especialmente se considerarmos que é um jornalista e cineasta falando -- é raríssimo no Brasil. E gostei muito também da crítica ao ambiente "artístico" brasileiro, que é ao mesmo tempo enorme fechado. Esse é o tipo de manifestação tão inteligente, tão sensata e em vários sentidos perfeita, que normalmente não esperamos que apareça de repente na nossa caixa de emails (valeu, Ram).

Alguns bons momentos, mas vale a pena ler inteiro:

• A matemática, para além dos seus usos, é guiada por um componente estético, por um conceito de beleza e de elegância que a maioria das pessoas desconhece. 
• Os artistas e boa parte dos cientistas sociais são quase sempre cegos a uma extensa gama do conhecimento. A quase totalidade dos personagens de classe média da literatura e do cinema brasileiro contemporâneos pertence ao mundo dos artistas e intelectuais. São jornalistas, escritores (geralmente em crise e com bloqueio), professores (quase sempre de história, filosofia ou letras), antropólogos, viajantes (à deriva), cineastas, atores, gente de TV ou filósofos de botequim.
• No ano passado, a PUC-Rio formou três físicos, dois matemáticos e 27 bacharéis em cinema. Em 2008, segundo o Inep [Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira], o país formou 1.114 físicos, 1.972 matemáticos e 2.066 modistas. Alimento o pesadelo de que, em alguns anos, os aviões não decolarão, mas todos nós seremos muito elegantes. 
• O país prospera à força de consumo, não de investimento ou invenção. 
• Sempre me espanto com a presença cada vez maior de projetos sociais que levam dança, música, teatro e cinema a lugares onde falta quase tudo. Nenhuma objeção, mas é o caso de perguntar por que somente a arte teria poderes civilizatórios. 
• Sem desmerecer os excelentes alunos de cinema, letras ou sociologia, é impossível negar que, para alguém sem grande talento ou dedicação, será sempre mais fácil ser medíocre num curso de humanas do que num de exatas. 
• É preciso criar mecanismos que os ajudem a escolher o caminho certo. Infelizmente, as artes e as humanidades, pelo menos por enquanto, não colaboram muito. Ao contrário. Nós disputamos esses jovens e, infelizmente, até aqui estamos ganhando a guerra.

Manifesto particular contra uma certa literatura brasileira contemporânea

Eu não leio mais escritor brasileiro que:

1. Reclame que escritor brasileiro não tem espaço na "grande imprensa", que a crítica literária pega no seu pé e/ou que brasileiro não lê.
2. Tenha mais de cinco tatuagens.
3. Tenha mais de 75% dos amigos que de qualquer forma estejam ligados a alguma forma de arte.
4. Publique resenha elogiando o livro escrito pelo seu companheiro de bar.
5. Use em suas eventuais críticas literárias e/ou entrevistas palavras como metalinguagem, capitalismo, Bukowski, etc.
6. Se sinta incluído em qualquer tipo de "Geração" ou espécie de "Movimento".
7. Frequente toda semana lugares como Mercearia Não-sei-o-que e/ou bares na Rua Augusta.
8. Escreva livros em que o protagonista seja um escritor sem inspiração.
9. Repita em quase todas as suas crônicas o nome do bairro em que mora.
10. Elogie ao mesmo tempo esses seriados que todo mundo assiste e filmes que ninguém assiste só pra mostrar -- de uma forma muito previsível -- como a sua noção de entretenimento é imprevisível.

Os dois ou três que sobraram, porém, continuo lendo com muito interesse e, espero, algum prazer.

Uma música para uma nova fase